POEMAS REFLEXIVOS -- I

                              VENTANIAS DA MENTE

 

 

 

Preciso adelgaçar cometas.

Preciso nivelar-me ao celeste azul.

Preciso ler Manuel Bandeira.

Preciso ouvir As Rosas Não Falam, Free Jazz e Blues!

 

 

Preciso garimpar as incertezas da certeza.

Preciso tomar um porre de Rum.

Preciso pôr as cartas sobre a mesa.

Preciso flertar com O Bando de Teatro Olodum!

 

 

Preciso sentir a textura da tez da minha Preta.

Preciso prementemente ir á rua desnudo do habitual calandu.

Preciso assistir --- de novo --- á película O Baixio das Bestas.

Preciso pagar --- com os juros da cara --- a conta de luz!

 

 

Preciso dormir por 8 horas.

Preciso comprar os acústicos de Jorge Benjor, Seu Jorge e Paulinho da Viola.

Preciso gostar de comer chuchu e saber que não sou cult.

Preciso criar coragem para suportar o peso da minha Cruz!

 

 

Preciso encarar a barrela.

Preciso fazer 1 bilhão de aquarelas.

Preciso descobrir minhas raízes no Benin ou na Nigéria.

Preciso demonstrar mais amor pela Terra.

Preciso ser Angola, Moçambique, Sudão, Somália, Etiópia e África do Sul.

Preciso chupar acerola, umbu, cajá além de caju.

Preciso largar mão de querer rimar com o fonema e o corpo da letra U!

 

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA

 

 

 

                       APRENDIZ DE DIVAGAÇÕES

 

 

 

O teto, acima de mim,

Jaz sólido:

Ainda sim,

Transidamente,

Eu o olho.

 

 

Escalavrado pela impotência,

Pelo vácuo, pelo tédio

De afluirmos,

Deliberadamente,

Ao estuário da vida,

Deixo-me domar

Pelo sobrepujante cavalgar

Do heliocentrismo da elegia.

 

 

Pesarosas lágrimas silentes

E invisíveis rolam-me

Por sobre a epiderme:

 

 

Crianças ao bel-prazer

Do ódio como agasalho

Da devoluta alma,

Devoluta pele e osso,

Devoluta mente,

Devoluto corpo

Sorvem a seiva da ira

Contra o Éden misericordioso.

  

 

A eloquente voz de um homem

Esculpe, esmerila e grita

A oração: --- Sim, nós podemos, irmãos!

 

 

No entanto,

Será que esta sentença

Ganhará eco de materialização

No reino, hein, das vis-metais mentes e preconceituosos corações?

 

 

 

Não,

Tal convicção não acalenta

Meu escaldado ente-razão,

Mesmo quando agora

O contemplo segurando,

Firmemente, o poderoso cetro

Que norteia o rebanho

Das extáticas cabeças

Que, pelo obliquo caminho, vão.

 

 

Na verdade,

O que, cotidianamente,

Vejo é a construção

--- cada vez mais célere ---

De megalópoles quatro palmos

Abaixo do chão.

 

 

Na verdade,

O que, cotidianamente,

Vejo são vales de incauto sangue derramado

Regozijarem os galhardos iconoclastas

Da sábia vida prolífica:

O escárnio á longevidade da sua celebração, sua mádida magia!

 

 

 

 

 

 

Testemunho

Querelas que libam,

Avidamente,

O vinho da ganância por poder

Abrir sulcos e crateras

Na mansão do nosso altruísmo.

 

 

Testemunho

O gradiente do egoísmo e da maldade

Açambarcar-se, avolumar-se,

Caminhar de mãos dadas com a ubiquidade,

Tornar-se loquacidade, astuto

E voraz canibalismo onipotente:

O arrebate do arrebol da crueldade iminente e a corrosão selvagem,

Chama alimentando a sequidão leviana, alarve

Qual ansiosamente se encontra

Ás portas do sol que liberta

A aura da universal supernova hecatômbica, fúnebre, funesta!

 

 

Enfim,

O teto, acima de mim,

Jaz sólido:

Contudo o liquefaço

Com o lume dos pensamentos

Que emana da íris dos meus olhos opacos.

 

 

Sim,

Contemplo, como se estivesse

Confinado numa câmara

Hermeticamente fechada,

A insensibilidade degustar-nos

Incomensuravelmente deleitada.

 

 

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA

 

 

 

 

 

 

 

            DE VOLTA A SEU CATIVEIRO

 

 

Se pudesse, contemplaria

Novamente aquela alva face da hipocrisia,

Indagar-lhe-ia se já está a sentir

O eco lancinante do remorso pelos delitos perpetrados

Que afloram e grassam vivazmente em seu jardim

                      De sentimentos sepultados.

 

 

Ah, se houvesse ensejo,

Questioná-la-ia a respeito do seu rincão íntimo:

Lugar onde despeja as razões e causa que forjam seu estilo:

Suas mágoas, frustrações, a célula malsã

Que cancerara seu personal organismo.

 

 

Sim, desnudá-la-ia, se condição tivesse,

Até a última camada

Para saber finalmente quem você é de verdade.

Então, observaria o desespero

Brotar do seu semblante não mais altaneiro,

Porque sua pessoa saberia que eu penetrei seu eu:

Sim, desvendei seu infame segredo.

 

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA

 

                           A EXPEDIÇÃO DA PALAVRA                        

 

 

O engendro engendra a pedra

A pedra pedra a escolha

A escolha escolhe a relva

A relva relva a aventura

A aventura aventura-se na caverna

 

 

A caverna caverna o quadraçal

O quadraçal quadraça o granito

O granito granita o alimento da História, o desconhecido

O desconhecido desconhece o ódio contra o desejo

 

 

O desejo deseja o idílio

O idílio idilia o clarão

O clarão clareia a vitória da irmanação

A irmanação irmana-se á celebração

A celebração celebra a desgraça

A desgraça desgraça a solitária

A solitária solitaria a miséria

A miséria miseria o esquife

O esquife esquifia a opressão        

A opressão oprime a tranca

A tranca tranca a paixão

A paixão apaixona-se pelo tecer do cérebro

O cérebro cerebra o criatório da mente

O criatório cria a chama

A chama chama a mão

A mão manipula a caneta

A caneta caneta a mágica

A mágica chamada PALAVRA. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA